Como você analisa o resultado das empresas? Falaremos nesse texto, sobre a interpretação do resultado operacional das empresas. O resultado, na DRE, relembrando, pode ser positivo ou pode ser negativo. Quando o resultado é positivo, nós chamamos de lucro e quando é negativo, nós chamamos de prejuízo. Para um melhor entendimento, dividimos o texto nos seguintes tópicos:
- Conhecendo a empresa e o seu modelo de negócios: entenda como as empresas geram caixa nas suas atividades
- Medindo o resultado operacional: conheça as principais medidas que são usadas pelo mercado para determinar se a empresa teve lucro ou prejuízo operacional, como EBIT, EBITDA, NOPAT e as margens de lucro
- Exemplo prático: usamos o caso real da Grendene ($GRND3) para aplicar os conceitos explicados no texto
- Dicas para análise
Boa leitura!
Para um melhor entendimento, sugiro também a leitura dos seguintes textos:
- Análise Fundamentalista: Entenda as Abordagens Top-Down e Bottom-Up
- Como usar as demonstrações contábeis para fazer uma boa análise fundamentalista
- O que é e como calcular as margens de lucro das empresas na bolsa
A empresa e seu modelo de negócios
Se tratando de avaliação de empresas, eu gosto de simplificar um pouco os conceitos e pensar na empresa como um único ativo gerador de caixa. Afinal, esse é o conceito mais plausível sobre um ativo: existe a capacidade de gerar benefícios futuros.
Modelo de negócios
Nesse sentido, ao se analisar uma empresa, antes mesmo de nos aprofundarmos em suas demonstrações financeiras, precisamos entender o seu modelo de negócio. Em outras palavras, entender como a empresa gerou resultados passados, e principalmente, a sua capacidade de gerar resultados futuros.
Para facilitar esse entendimento, vamos separar as companhias em dois grupos: financeiras e não financeiras. Vamos ver de uma forma bem simples, como cada uma gera caixa a partir de suas operações:
- Financeiras: Geram caixa a partir do spread bancário. Ou seja, tomam emprestado a uma taxa via captações e emprestam aos seus clientes por uma taxa superior (veja nosso texto com dicas de análise de bancos).
- Não financeiras e serviços em geral: Geram caixa essencialmente a partir da venda de mercadorias e de serviços por valores superiores aos de custo.
O que quero mostrar com esses exemplos é que, um ponto primordial na avaliação de qualquer empresa é o de se verificar a sua capacidade de geração de caixa através de suas operações. Veja, se olharmos apenas para o lucro líquido evidenciado na demonstração de resultados, estamos vendo todo o confronto entre as receitas custos e depesas de determinado período, seguindo o regime de competência.
Nesse sentido, a companhia pode apresentar um elevado lucro líquido no período, o que nos faz saltar os olhos ao olharmos para a DRE. Entretanto, é preciso ter bastante cuidado ao se olhar apenas para o lucro contábil. Como falei acima, precisamos atentar para a capacidade operacional da empresa, ou seja, olhar para a geração de resultados a partir de sua operação principal.
Medindo o resultado operacional
Para mensurar o resultado operacional, os investidores possuem ao seu alcance, uma série de medidas que podem ser utilizadas. Separei algumas dessas métricas, que podem ser obtidas diretamente da demonstração de resultados, com alguns pequenos ajustes.
EBIT – Lucro antes do resultado financeiro e impostos
O EBIT refere-se do lucro bruto menos as despesas operacionais. Não computando o resultado financeiro (despesas e receitas financeiras). Como a depreciação e a amortização entram no cômputo do EBIT, podemos interpretá-lo como um lucro operacional líquido do “desgaste” do ativo depreciável. Mas, como não temos a separação do que é operacional e o que não é operacional na contabilidade, o EBIT é apenas uma aproximação para o resultado operacional, porque podemos ter itens não operacionais nele.
EBITDA – Lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização
Trata-se do EBIT somado com a depreciação e amortização do período. Por adicionar a depreciação e amortização, o mercado de forma geral, o interpreta como a capacidade da empresa de gerar caixa naquele período. Mas cuidado, no releases de resultados, já vi diversos tipos de EBITDAs: IFRS, ajustado, orgânico, recorrente, não recorrente e por aí vai. Cada qual com as suas especificidades. Particularmente, para fins de análise de geração de caixa do período, prefiro utilizar o fluxo de caixa livre (para a empresa e para o acionista). Veja maiores detalhes, no nosso texto sobre o EBITDA ajustado.
NOPAT – Lucro operacional líquido dos impostos
Trata-se do EBIT líquido dos impostos sobre o lucro. Ou seja NOPAT = EBIT x (1 – alíquota do IR/CSLL). Em outras palavras, podemos ler este indicador como o resultado da operação, líquido dos impostos.
Interessante notar que o EBIT, EBTIDA e o NOPAT não levam em consideração a forma de financiamento da empresa, ao passo que as despesas financeiras (basicamente o custo das dívidas) não estão incluídas em sua mensuração. Dessa maneira, estamos falando tão somente das operações da empresa.
Margens de lucro
Por sua vez, as margens de lucro também podem ajudar muito em uma análise inicial, pois são simples de mensurar e de interpretar: Basta dividir o item analisado pela receita líquida, seja Lucro bruto, EBIT, EBITDA ou líquida. Algumas características setoriais podem ser evidenciadas através da análise das margens, como percentuais médios para determinados setores.
Leia mais sobre como calcular as margens de lucro das empresas clicando aqui.
Qual indicador utilizar para analisar o resultado operacional?
A resposta para esta pergunta depende da informação que o analista queira extrair. Veja que os indicadores acima são bem parecidos em essência, mas cada qual leva em consideração itens que podem mudar bastante a interpretação que estamos tendo. De forma geral, como estamos tratando da empresa como um único ativo capaz de gerar caixa, e de sua capacidade operacional, considero o NOPAT um indicador mais informativo, pois leva em consideração mais itens operacionais que o EBIT e o EBITDA, ao considerar tanto a depreciação e amortização, como os impostos sobre o lucro.
Exemplo prático da análise do resultado das empresas
Para ilustrar na prática os pontos que vimos até aqui, vamos analisar as demonstrações contábeis da Grendene. Vamos olhar rapidamente sua demonstração de resultados dos anos de 2017 a 2019.

Fonte: RI Grendene (adaptado)
Se olharmos para as margens de lucro da empresa, podemos observar uma redução dessas margens desde o início do período de análise. A partir desses índices, podemos inferir que a operação da empresa está ficando menos lucrativa no decorrer do tempo. Diversos fatores podem influenciar a deterioração dessas margens, como por exemplo:
- Retração econômica e do mercado, o qual a empresa está inserida, reduzindo assim as vendas
- Maior número de concorrentes, o que pode forçar a empresa a reduzir suas margens de lucro para competir por preço
- Mudanças na estrutura produtiva da empresa, elevando seus custos
Além das margens de lucro, vejamos também os indicadores operacionais que discutimos acima (EBIT, EBITDA e NOPAT):

Fonte: DFP, adaptado
Da mesma forma que as margens de lucro, observamos também redução do lucro operacional medido pelos índices acima, corroborando com a piora da lucratividade da empresa em suas operações principais.
E o não operacional?
Interessante notar também que a empresa possui um alto volume de receitas financeiras. Em sua maioria, essas receitas são geradas por aplicações financeiras feitas pela empresa, não tendo assim associação direta com as atividades operacionais da companhia. A Grendene é conhecida por ser bastante conservadora nos seus investimentos e também por ter benefícios fiscais que a impedem de distribuir dividendos, por isso o volume tão alto de aplicações financeiras, que gera um alto resultado financeiro – principalmente na época em que tínhamos taxas de juros básicas muito altas.
Podemos observar isso olhando para o Balanço patrimonial, no lado dos ativos, na linha de aplicações financeiras:

Fonte: RI, Grendene (adaptado)
Nesse sentido, se somarmos os percentuais (em relação ao ativo total) de aplicações financeiras de curto e de longo prazo, vimos que 51% (32% CP + 19% LP) dos ativos está investido em aplicações financeiras. Mas você também pode indagar: as receitas financeiras aumentam o lucro, além disso, uma posição confortável de caixa permite que a empresa atravesse crises sem maiores problemas, correto?
Sim, entretanto, isso também pode indicar que a empresa tem poucas oportunidades de investimento e crescimento futuro, pois, em virtude da falta de oportunidades de investimentos que permitam o crescimento, a empresa mantém esse montante em aplicações. Esta visão é corroborada pela redução das margens e dos resultados operacionais, que vimos ao ao analisarmos a DRE.
Além disso, as receitas financeiras dependem muito das taxas de juros que remuneram essas aplicações. De forma geral, elas são norteadas pela taxa básica de juros (Selic). Como a Selic caiu bastante ultimamente, isso influenciou de forma significativa o resultado da empresa, visto a representatividade das receitas financeiras no lucro contábil da Grendene.
Dicas para análise
Lembrando por fim, que a análise fundamentalista é um conjunto de diversas informações, desde macroeconômicas até as específicas da companhia em questão. Por mais que o foco do texto tenha sido a interpretação do lucro operacional, diversas variáveis também devem compor as suas análises:
- Ambiente macroeconômico do país
- Governança corporativa
- Regulação
- Vantagem competitiva
- entre outros.
Saliento também a importância do acompanhamento dos indicadores setoriais específicos, afim de comparar a empresa em análise com seus principais concorrentes. Por exemplo, você pode conhecer os indicadores específicos das companhias aéreas clicando aqui.

Analista de conteúdo | Mercado financeiro no TradersClub
Contador, Mestre em Ciências Contábeis. Foi professor/pesquisador do departamento de contabilidade da UFRN e atuou em contabilidade de S.A. É investidor com base em análise fundamentalista.