O que é a alta do dólar?
Antes de tudo, a alta do dólar acontece quando a demanda pela moeda americana cresce, isso faz com que seu preço também suba, na mesma medida em que mais pessoas querem comprar dólares.
Neste texto você entenderá como a alta do dólar pode influenciar os balanços das empresas. Vamos abordar os seguintes tópicos:
- Impactos no balanço
- Como a empresa contabiliza as oscilações de moeda
- Dicas de análise
Para um melhor entendimento, recomendamos que você também leia:
- Contabilidade e investimentos: dois irmãos que devem andar juntos
- Débito e crédito: ação e reação aplicadas ao mundo corporativo
- A natureza das contas e os conceitos básicos de contabilidade
A cotação da moeda americana vem subindo bastante, se aproximando de mais uma barreira psicológica: a dos R$ 6. Entretanto, como isso impacta os balanços das empresas brasileiras?
De uma forma bem simples, vamos analisar seu efeito em cada elemento contábil:
- Ativos e Receitas
- Passivos, Custos e Despesas.
1) Ativos e Receitas
Os ativos representam os investimentos feitos pela empresa com o intuito de gerar caixa (receitas). Nesse sentido, empresas que têm receitas em dólar (exportações) podem se beneficiar da alta do dólar.
No entanto, cuidado na análise. Se os custos que a empresa tem para auferir as receitas também estão ligados à moeda americana, é esperado um aumento proporcional, tanto na receita, quanto no custo dela. Desta forma, não ocorrerão benefícios assim tão consideráveis.
Do mesmo modo, devemos atentar para a necessidade de investimentos em novos ativos (Capex). Se estes investimentos precisarem ser obtidos no exterior, a empresa terá aumento no valor a ser desembolsado (investido).
Além disso, se a empresa possui suas receitas, ou uma parte delas em dólar e seus custos e despesas em reais, pode-se observar um aumento considerável em suas margens de resultado. Este é o caso das companhias exportadoras.
Vejamos isso na prática
Vamos usar como exemplo a Klabin (veja nosso vídeo com análise do balanço do 1T20).
A empresa é a maior produtora e exportadora de papéis do Brasil, com foco na produção de celulose e embalagens.
Vejamos como é a proporção volume de vendas nos mercados interno e externo.
Conforme ilustrado acima, podemos verificar que, quase metade do volume de vendas da empresa é feito para mercado externo, o que pode beneficiar a empresa na alta do dólar.
Em segundo lugar, os custos da empresa são em reais, o que pode elevar a margem bruta da empresa.
Para analisar a margem bruta, vamos utilizar as informações da demonstração de resultados (DRE):
DRE | 1T19 | 1T20 | Δ% |
Receita liquida (1) | 2.473 | 2.620 | 5,9% |
(-) Custos (2) | (1.584) | (1.560) | -1,5% |
(=) Lucro bruto (3) | 889 | 1.060 | 19,2% |
Margem Bruta (3/1) | 35,9% | 40,5% | 12,5% |
Fonte: DFP 1T20
Observamos que, embora a receita tenha subido 5,9%, a margem bruta da empresa teve um incremento de 12,5%. Isto é explicado, em parte, pelo fato de a empresa ter uma parcela de sua receita em dólar, e seus custos em reais, levando a um aumento da margem bruta.
2) Passivos, custos e despesas
Por outro lado, os passivos, representam as exigibilidades que as empresas possuem para com terceiros, ou seja, eles evidenciam os futuros desembolsos que a empresa fará para liquidar essas obrigações.
De forma inversa do ativo, se a empresa possui passivos atrelados ao dólar, na medida em que o dólar sobe, o valor do passivo também subirá, visto que a companhia terá de comprar dólares para honrar seu compromisso.
Empresas importadoras
Uma situação um tanto desfavorável ocorre quando os ativos e as receitas são realizados em reais, e os passivos e despesas em dólar, que é o caso das empresas importadoras.
Usando novamente a Klabin como exemplo, vamos verificar como se comportaram os saldos de empréstimos em moeda estrangeira.
4T19 | 1T20 | Δ% | |
Empréstimos em moeda estrangeira | 22.376 | 25.302 | 13,1% |
Despesas financeiras | (585) | (6.231) | 90,6% |
Fonte: DFP 1T20
Podemos observar, um aumento no saldo de empréstimos em moeda estrangeira em 13,1%, por outro lado, as despesas financeiras aumentaram 90,6%. Isto ocorreu como resultado do aumento do dólar no período.
Como a empresa contabiliza a variação do dólar?
Vejamos por exemplo, como são realizados os registros contábeis feitos pela empresa, para ajustar sua dívida em moeda estrangeira:
Alta do dólar:
- D – Despesa financeira (Perda com variação cambial)
- C – Passivo (Aumento do valor da dívida)
Queda do dólar:
- D – Passivo (Redução do valor da dívida)
- C – Receita financeira (Ganho com variação cambial)
Nesse sentido, é importante ressaltar que os ganhos e perdas com variação cambial nos ativos e passivos, podem não afetar o caixa da companhia no curto e médio prazo.
Isso ocorre pois, estes lançamentos são realizados para “dolarizar” os valores que estão presentes no balanço patrimonial. Leia nosso texto sobre lucro e fluxo de caixa.
Por exemplo, se a empresa tiver 6 anos para amortizar sua dívida, a variação do dólar nos próximos meses pode não gerar um grande impacto no caixa da companhia de forma tão imediata, visto que os pagamentos serão feitos no futuro.
As empresas podem se proteger das oscilações na moeda?
Uma das formas que as empresas podem adotar para reduzir sua exposição a alta do dólar, é a implementação de estratégias com instrumentos derivativos com fins de hedge (proteção) contra essas oscilações.
Por exemplo:
- contratos a termos
- opções
- swaps.
Em síntese, tais instrumentos derivativos permitem que as empresas acertem de forma antecipada, os valores da moeda em uma data futura.
Nesse sentido, essas estratégias permitem que a empresa foque na sua operação, e não com oscilações de preços de moeda.
Como saber se a empresa implementa estratégias de proteção?
Em outras palavras, podemos verificar isso através das notas explicativas, divulgadas em conjunto às demonstrações financeiras das empresas. De acordo com os exemplos anteriores, vamos verificar a Klabin:
Por outro lado, no caso específico da Klabin, a administração da empresa não adota instrumentos de proteção contra variações do dólar, pois entende que existe um hedge natural em sua operação, ao ter parte de suas receitas também em dólar.
Examine todo o ambiente o qual a empresa está inserida
Em resumo, também precisamos verificar como a alta no dólar influencia de forma indireta na empresa.
Como por exemplo, podemos verificar se há concentração de clientes que podem consumir menos produtos e serviços, ou fornecedores que podem ter dificuldades na disponibilização de produtos e serviços para a empresa.

Analista de conteúdo no TradersClub | Mercado financeiro
Contador, Mestre em Ciências Contábeis. Foi professor/pesquisador do departamento de contabilidade da UFRN e atuou em contabilidade de S.A. É investidor com base em análise fundamentalista.