Nesse texto, falarei sobre o modelo econômico e contábil das empresas que operam programas de fidelidade com clientes. Em outras palavras, são empresas que comercializam as milhas/pontos, que são os direitos de aquisição de produtos/serviços:
- Programas de fidelidade: quais os principais tipos de receitas auferidas por essas empresas?
- Reconhecimento da receita com programas de fidelidade
- Empresas do setor: principais características das empresas que operam com programas de fidelidade
Boa leitura!
Leia mais sobre contabilidade financeira:
- CPC 47 – entenda a mensuração e o reconhecimento das receitas
- CPC 47 – mensuração e reconhecimento das receitas (parte II)
- Aspectos contábeis dos juros sobre capital próprio
Receitas com programas de fidelidade
São três as espécies principais de receitas auferidas por essas empresas:
- Spread sobre o custo
- Breakage
- Receita financeira
Spread sobre o custo
O spread sobre o custo representa justamente a diferença entre a receita de venda da “milha” e o seu respectivo custo de “aquisição”.
Breakage
Por sua vez, o breakage é o ganho decorrente das milhas que foram vendidas e que não são resgatadas. Isto ocorre porque nem todos os adquirentes utilizam seus “pontos” e eles expiram depois de um certo período.
Receita financeira
O resultado financeiro decorre da receita de “floating” e de financiar seus “fornecedores” (antecipação de compras). Estas empresas têm um ciclo operacional/caixa bastante favorável: vende as milhas hoje e o cliente só “resgata” depois de um tempo.
Reconhecimento da receita dos programas de fidelidade
Apesar do caixa entrar hoje, quando a empresa vende as milhas e recebe o dinheiro, o reconhecimento da receita e do lucro ocorre em etapas. O spread sobre a compra das milhas só é reconhecido quando o cliente resgata. É nesse momento que a empresa cumpre sua obrigação contratual (para mais detalhes, sugiro a leitura de nossos textos sobre o CPC 47 – reconhecimento das receitas).
Nesse sentido, quando o cliente resgata os pontos, extingue-se a obrigação da empresa. A partir dai a obrigação será do prestador de serviços, varejista etc. – que deverá entregar televisores, passagens aéreas, litros de gasolina, etc. Ou seja, a empresa de fidelidade é o “agente” e o fornecedor de serviço/produto é o principal
Portanto a empresa de fidelidade é “mero” intermediador das “milhas” pois:
- Não adquire controle do serviço/produto
- Não possui risco de estoque.
Por esse serviço de intermediação, ela recebe um fee, que é justamente a margem sobre o custo de aquisição dos “pontos”.
Contabilização
A receita de breakage é reconhecida na DRE antecipadamente, isto é, não precisa esperar as “milhas” expirarem – desde que a empresa comprove com base no histórico e através de modelos quantitativos que partes dos direitos detidos pelos clientes nunca serão exercidos.
Receita financeira segue o racional normal, pro rata e decorre tanto da aplicação dos recursos no mercado quanto dos juros decorrentes de “descontos” por antecipar valores aos fornecedores.
Características das empresas que atuam com programas de fidelidade
Essas empresas possuem algumas características específicas, tais como: pouco imobilizado (asset light), intangível (basicamente software).
Nos Balanços dessas empresas, muito caixa e títulos de valores mobiliários (TVMs), um pouco de contas a receber (prazo médio curto) e “antecipações de compras”.
Passivo: pouca ou nenhum dívida (pouco alavancada pois não precisa de caixa). A principal conta do passivo: Receita Diferida (Antecipação de Clientes) (obrigação de entregar ao cliente). Quando recebe caixa é passivo, só vira receita quando resgata (exceto breakage).
DRE conforme mencionado muita receita e pouquíssimo custo/despesa: basicamente custos administrativos, amortização de software e despesas comerciais/marketing. E claro, tributos.
Em suma, são empresas: bem líquidas e pouco alavancadas altamente lucrativas, margens extremamente altas. Muito rentáveis, pois possuem baixo “capital investido”.
Texto produzido com material divulgado pelo Professor Fernando Dal-Ri Murcia, da FEA-USP, autor de vários livros e artigos sobre contabilidade.